segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Sou do Tempo que

Sou do tempo em que, ao sair para a rua, os meus pais me mandavam cumprimentar todas as pessoas.

Sou do tempo em que os meus pais e os pais dos meus amigos de infância se encontravam no final do dia para brincar com os seus filhos. A coisa mais interessante não eram as brincadeiras, mas o modo como aqueles homens e mulheres rompiam com as barreiras, acabavam por se conhecer melhor e dando-se a conhecer, e a vizinhança era mais humana e próxima. Quase não se via o diz que disse , mas via-se muita solidariedade.

Sou do tempo em que, na salas de aula, os alunos se levantavam e permaneciam em pé sempre que uma pessoa adulta entrava na sala. Só nos sentavamos apos indicaçao para o fazer. Dizia entusiasticamente: "Bom dia!" E cantava sempre uma canção de boas vindas.

Sou do tempo em que, no pátio da escola, todas as segundas-feiras cantávamos os Hinos Nacional, da República, da Bandeira, Canção do Soldado e do Marinheiro. E tínhamos que saber a letra, não podia apenas fazer mímica.

Sou do tempo em que se aprendia matemática cantando a tabuada, tirar a prova dos nove. , estou certo de matemática era semelhante a aprender o português. Aprendia-se fazendo cálculos e não se marcava com "X" as respostas dos problemas.

Sou do tempo que, quando um adulto estava a conversar na sala, as crianças não participavam da conversa. Se precisasse cruzar a sala a melhor opção era esperar o fim da conversa. Até podia fazê-lo pedindo licença, com toda a educação, mas éramos ensinados a esperar a nossa vez. Criança não chamava a atenção, não fazia birra nem pirraça; muito menos respondia os pais, dizia palavrões ou mesmo encarava os pais.

Sou do tempo em que os melhores brinquedos eram aqueles feitos por alguém que nós gostávamos muito e não precisava sequer de corda ou pilha, mas que desse asas à imaginação. Esta permitia-nos brincar horas a fio, divertia-nos muito e dormíamos pesados. Ninguém abria a boca para dizer: "esse menino usa "duracell" ou "tem energia demais!" Nossas energias eram queimadas a valer em brincadeiras saudáveis.

Sou do tempo em que os vizinhos, todas as noites, traziam suas cadeiras, sentavam-se nas calçadas e conversavam sobre si. Lembro-me que era uma época em que todos se conheciam. Quando paravam para se cumprimentar sabiam o que dizer e o que perguntar: "Melhorou daquele problema?" "Seu filho obteve a vaga na escola ?" Tinham tempo para si e para os outros. Encontravam-se sempre nas festas de família, cumprimentavam-se por ocasião das festas de fim de ano. Quando se encontravam num funeral era para chorar sentindo a perda de alguém que se conhecia de facto.

Pode parecer que ao escrever todas estas coisas eu seja um saudosista. Na verdade não é isso. Estou a compartilhar um tempo que vivi e que alguns de vocês também viveram. Uma época que existiu de facto e não apenas algo que possa ser lido em livros do passado.

Creio que não precisamos voltar a fazer todas estas coisas. Os tempos são outros e nós temos que nos adaptar a este contexto. Contudo, como pessoas, precisamos "baixar os faróis" para olharmos uns para os outros e compartilharmos o que temos em comum. E como temos coisas em comum!

Quem é motorista sabe que há momentos na estrada em que é preciso baixar os faróis para ver melhor as coisas. Na vida há momentos parecidos: Tu desliga o farol alto, acende a luz baixa e… começa a ver melhor. "Ih! Tu estás aí! Que bom! Deixe-ma lhe dar-te um abraço!" Isso pode ser quando estás a sair de casa para trabalhar; quando chegas ao trabalho e encontras um colega "em baixo"; podes ser num momento em que alguém diz para ti "estou muito triste , alguém que tanto amo me feriu bastante hoje!". O que é que tu podes oferecer?

Pode ser com uma criança. Ela, é inocente, resolve parar bem na tua frente, a querer brincar. Tu não tens tempo para brincar, estás atrasado. Mas podes, simplesmente, dar-lhe um sorriso, fazer um afago, dar-lhe um beijo ou um abraço, pegando-a no colo. Um minuto oferecido a alguém pode fazer da tua vida melhor por um momento, por todo o dia ou até mesmo marcá-la para sempre.

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